Google Website Translator Gadget

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Vendedoras da Ribeira

A rapariga que faz a caridade de viver comigo ofereceu-me um pequeno curso de sushi. Para alguém que só sabe fazer decentemente meia dúzia de coisas, incluindo três maneiras de cozinhar ovos, é mais que um desafio. É um voto de confiança na minha capacidade de enfrentar os meus piores receios e doravante usar com mais regularidade a cozinha, aquele antro de acidentes domésticos. Na verdade, este é um presente de grego, apesar das origens espanholas de quem o oferece. Como dizia um professor meu, não há almoços grátis e a oferta tem como contrapartida a expectativa de almoços (e jantares) caseiros preparados por este iniciado nas artes culinárias.

Divago mas com um motivo e que é o de mostrar que para vencer o desafio colocado com este presente, mais do que aprender as técnicas da cozinha japonesa, terei que passar por uma verdadeira mudança de atitude. Nesta lógica decidi-me hoje a entrar numa praça, a da Ribeira, coisa que terei feito tantas vezes quanto os dedos que tenho na mão e que ainda são os mesmos com que nasci, apesar das últimas manhãs de sábado passadas a manipular facas ameaçadoras como dentes de piranhas.

A praça tem uma fachada bonita e situa-se numa envolvente agradável, com a ribeirinha Avenida 24 de Julho pela frente e o pequeno mas simpático jardim da Praça D. Luís I ao seu lado.
Por dentro também não é desprovida de interesse, tendo uma nave central coberta com uma estrutura metálica típica dos edíficios do início do século XX. Quando não funciona como praça tem condições para a realização de eventos como feiras (realiza-se semanalmente uma feira de coleccionismo), refeições para centenas de pessoas e já foram famosas as tardes de baile domingueiras, que juntavam os saudosos dessa tradição lisboeta.
 
Claro que um dos maiores encantos de uma praça são os produtos que lá se vendem, em particular as frutas e hortaliças. Com a máquina ao ombro, é óbvio que era disso que ia à procura quando lá decidi entrar e as minhas expectativas não foram defraudadas.


Mas o inesperado para mim, foram as peixeiras e as vendedoras de frutas e legumes da praça da Ribeira pela sua disponibilidade para a conversa e para se deixarem fotografar. A elas tenho que agradecer a simpatia com que receberam um completo estranho armado com uma máquina fotográfica.
Agradeço à Dona Teresa, que se queixava do negócio andar fraco, mas sem qualquer ponta de mágoa na voz e curiosa quanto à razão que me levava a pedir-lhe para a fotografar - "as fotografias é para quê, filho?". À dona Celeste que anda nesta vida há sessenta e dois anos, e que hoje lá esteve às cinco da manhã apesar da idade e do frio insuportável. À Dona Maria que me contou histórias de quando ainda vivia em Trás-os-Montes e calçada nas suas socas de madeira levava cabritinhos às costas para os vender em Vila Real. E às outras, as que simplesmente se riam do pedido inusitado e apesar disso a ele acediam. Foram elas que fizeram valer a pena a ida à praça da Ribeira.


sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

E os bichos da seda?

Hoje fui almoçar com uma amiga que mora perto do Jardim das Amoreiras. Como o céu da manhã prometia dar-nos algumas tréguas, levei a máquina para tentar a sorte. É claro que não me arrependi. O jardim é lindo, magnífico, repleto de amoreiras e de tantas outras espécies de árvores que gostava, um dia, de conseguir identificar.


Esperávamos almoçar no Quiosque, mas a sombra, o frio e o vento (e o facto de termos um bebé de cinco meses a fazer-nos companhia) levaram-nos para lugares mais abrigados. Ao contrário destes corajosos...


Mesmo que só de passagem, ainda que sem lhe dar a devida atenção, é impossível ficar indiferente às suas arcadas, às suas janelas, às árvores despidas e àquela loja de outros tempos...
 

Foi assim que, de barriga cheia do almoço e da conversa, decidi deixar o jardim para um dia mais quente e dediquei-me a uma das minhas ruas preferidas em Lisboa: a Rua das Amoreiras. Não sei se é pela grandiosidade do arco, pelas cores dos prédios, pelos jardins de algumas das casas ou simplesmente pela alma que lhe sinto, mas é uma rua que apesar de (muito) íngreme não me canso de percorrer.    


Ser turista à hora de almoço implica fazê-lo mais depressa do que a ocasião mereceria. Mas significa também que podemos ser turistas num sítio que está ao nosso alcance todos os dias, que podemos revisitar sempre que nos apetecer ir à procura de um novo pormenor. E o pequeno grande pormenor de hoje foi este contraste magnífico em que, curiosamente, nunca tinha reparado. Até hoje. Com a minha máquina.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Da Baixa ao Castelo

Lisboa é a segunda melhor cidade do mundo, numa lista muito pessoal, preconceituosa e limitada como devem ser todas as listas deste género. Por causa do gosto de tirar fotografias, tenho vindo a descobrir mais a cidade e até a gostar mais dela. Escrever sobre Lisboa na perspectiva de um turista doméstico, espécie inócua de espião infiltrado, não é fácil. Mas, a propósito de uma saída fotográfica, a Susana lançou-me esse repto e eu não quis deixar de o aceitar.

A minha anarquia mental impede-me de descrever detalhada e factualmente o percurso que fizemos no Domingo. Em traços gerais, subimos da Praça da Figueira pela vertente oeste da colina do Castelo, a irmã borralheira das vaidosas colinas de Santa Catarina e de São Roque que se erguem do outro lado da Baixa e que colhem as preferências dos visitantes forasteiros, atraídos pelos encantos do Bairro Alto e do Chiado.


Esta colina ou melhor, esta vertente da colina, não é gaiteira como as suas irmãs que se alindam para os estranhos. Não. Estas ruas, vielas, becos, travessas e escadinhas existem para quem lá vive. É possível percorrer ruas inteiras sem encontrar uma única loja, bar ou esplanada para turistas. Estas ruas exibem roupa estendida (muita), alguns vizinhos a conversar e velhotes nas janelas. Também encontramos casas devolutas (tapadas até ao pescoço), carros estacionados nos limites da legalidade (e da possibilidade física) e grafítis sem gosto. Faz parte de Lisboa e, se esta colina falasse, era disso que se ia queixar, em lamúrias que fariam lembrar as das velhotas que lá vivem, sobre as maleitas que lhes apoquentam a idade.




Por este lado não se entra no Castelo. Tem que se contornar o topo da colina até encontrar a entrada e nós fizemo-lo pela esquerda o que, vejo agora, é o caminho mais longo. É mais longo mas vale a pena. Fez-nos passar pelo Largo com o nome mais patusco de Lisboa, e cuja origem vale a pena conhecer em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/outros/domingo/jardim-das-pichas-murchas . Através da rua de S. Vicente, chega-se às mais cosmopolitas Portas do Sol, onde os eléctricos se movimentam em manobras dignas da Space Mountain.



Os moradores das ruas que nos levam até ao Castelo são simpáticos como as casas em que habitam e que parecem ter sido arquitectadas por crianças tal é a semelhança com os desenhos que estas fazem. Mesmo ostentando a necessidade de alguns retoques, são bonitas, com portas pequenas e janelas onde espreitam cabeças que sorriem e nos falam se lhes dermos atenção.

Os seguranças do castelo é que não devem ser de lá. Desconfia-se que moram em Rio de Mouro ou outro subúrbio igualmente lúgubre e que são treinados para evitar qualquer contacto humano. Felizmente não são todos assim. O segurança que tem a missão de vigiar o portão da entrada é simpático e, apesar de já estarmos a sair depois da hora, foi cordial. Após uma curta conversa em que fiz uma entrada a pés juntos nas canelas da História de Portugal (digna de um cartão vermelho) ao perguntar onde é que Egas Moniz se tinha entalado, deixou a “minha esposa” segurar a chave do castelo enquanto eu a fotografava. A foto não presta mas é uma boa recordação de uma tarde de Inverno bem passada. E turista que se preze não resiste a um souvenir.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Numa tarde domingueira

Domingo amanheceu sem nevoeiro e pude manter a combinação que tinha feito com um amigo de irmos tirar fotografias para o Castelo na parte da tarde. Estacionámos nos Restauradores e entrámos pelo Largo de S. Domingos que, entre castanhas assadas, ginginha e um enorme amontoado de gente de inúmeros países, raças e credos, é provavelmente a zona mais internacional de Lisboa.


A partir da Praça da Figueira, lá fomos nós pela João das Regras, de narizes no ar e máquinas em punho, preparados para começar a subir, ainda sem saber se pela Sé, se pela Mouraria. Quando vimos as escadas do Beco dos Surradores, nem hesitámos: seguiriamos à aventura pelas ruelas estreitas que galgam a colina, onde os prédios quase se tocam, os carros passam a custo e se vive um ambiente que mistura a aldeia com a urbe impessoal, com moradores antigos e novos, com cumplicidades e indiferenças, com prédios degradados, tristes e quase inabitáveis e prédios recuperados, magníficos e inacessíveis a tantos que poderiam realmente dar uma nova vida à cidade.


Aqui e ali, a dedicatória de um ou outro artista apaixonado pela cidade e pela sua gente. Um pouco por todo o lado, muitos grafitis, de uma maneira geral aleatórios e sem propósito mas, por vezes, sendo quase mensageiros da cidade que se vê cada vez mais deserta e abandonada e com cada vez menos histórias para retratar numa parede.



 
Seguimos caminho, da Mouraria para a Graça: Rua das Farinhas, Costa do Castelo, Rua de S. Tomé e um pequeno desvio até ao miradouro das Portas do Sol. É que se Lisboa é feita de contrastes, o maior é o que se sente quando, no fim de uma ruela, nos deparamos com a cidade e o rio a perder de vista.


Já no castelo, percorremos o bairro labiríntico que nos leva à entrada principal, onde domina a cor da roupa estendida, de alguns prédios recuperados, das lojas turísticas e de rostos que assomam à janela, sempre com uma resposta afável ao nosso 'boa tarde' e o sorriso próprio de quem aprecia aquele rebuliço diário que contraria a monotonia dos dias que já vão longos nas suas vidas.


Não imagino o que seria de Lisboa sem o Tejo, sem o seu contraste com a luz amarela, branca e vermelha do casario, que se vai desvanecendo com o passar das horas...




... e quando essa luz acaba, aí começa o número que se segue.






A luz de Lisboa não me apaixona só de dia. Hoje o meu coração ficou ali, no Castelo, quando caiu a noite.


quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Nas nuvens


Hoje fui fazer um exame médico perto do Campo Pequeno, de manhã bem cedo. Como sabia que iria ter que fazer tempo até à hora marcada, pareceu-me uma boa oportunidade para tirar umas fotografias, que é sempre mais simpático do que estar na sala de espera de uma clínica. Assim, lembrei-me de levar a máquina, o que foi um verdadeiro golpe de sorte.



O jardim que circunda a praça de touros estava magnífico, a começar a agitar-se com os que o atravessam distraidamente na sua rotina matinal, os residentes a passear os cães, tudo e todos rodeados pela nuvem que hoje decidiu visitar Lisboa.




As árvores, despidas, tiritavam de frio, mas pareciam também elas deslumbradas pela beleza daquele momento. Eu fiquei, apesar de ter tiritado também. Senti-me, ali e então, personagem de um livro de Zafón. 

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...