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sábado, 26 de março de 2011

Praças tristes e bairros alegres

A volta que fiz ontem começou na Praça da Alegria. Não a fotografei porque é bonita mas ingrata. Estamos de relações cortadas: Deixou o Manuel João sair do Maxime e isso deixa-me chateado. Virei-lhe rapidamente as costas e, sem olhar para trás, segui pela Rua da Alegria em direcção à Calçada da Glória que comecei a subir mas não até ao fim. A promessa de paredes cobertas de graffiti levou-me a cortar à direita até à Travessa do Fala-Só.


Cortei à esquerda, ao reencontro da Glória e deparei-me com pintores de graffiti a trabalhar em plena luz do dia. A estupefacção durou pouco tempo. Apenas o necessário para perceber que não estavam a pintar paredes mas antes uma espécie de tapumes lá colocados para esse efeito.


E os trabalhos que ali estão são incríveis. Os tapumes, muitos com focos de luz para permitir a exibição nocturna, foram colocados pela câmara municipal, numa iniciativa que se louva.


Segui até ao miradouro de S. Pedro de Alcântara, bastante concorrido não só por quem andava à procura de sítio para apanhar o melhor boneco da baixa lisboeta mas também pelos que aproveitavam a promessa cumprida pela meteorologia de “boas abertas”, enchendo a esplanada do jardim para tomar um copo enquanto se lê um livro ou põe a conversa em dia.

E este é um dos melhores sítios de Lisboa para se assistir ao espectacular fim de tarde, de costas voltadas para a azáfama do trânsito na rua que tem o mesmo do nome do miradouro.


O sol andava um bocado envergonhado (como disse atrás só aparecia em algumas boas abertas), dando ao casario da baixa e da colina do castelo aquele tom que faz lembrar aquele que as páginas dos livros adquirem com o passar dos anos. Junte-se o cinzento azulado que o rio adquire nestes dias e temos lisboa num dos seus melhores momentos. É só disparar.






Deixei S. Pedro de Alcântara para trás e deambulei pelo Bairro Alto onde reencontrei alguns dos sítios onde já não entro há demasiado tempo e que despertavam do sono diurno, preparando-se para a noite que lhes sustenta a existência.


A minha volta acabou na Pérola das Gáveas do meu amigo Alexandre. Há uns tempos, o Alexandre mandou os chefes, patrões e outras chatices às urtigas e montou esta pequena mas muito completa loja gourmet onde vende os produtos que conhece e que descreve pormenorizadamente porque gosta deles como ninguém que eu conheça.

Estivemos um bocado na conversa, acompanhada por umas cervejinhas, até começarem a chegar os primeiros clientes que tinham marcado uma experiência de degustação. Paguei o vinho que o Alexandre me aconselhou – a Pérola tem uma oferta variada mas especializou-se em vinhos de qualidade de pequenos produtores quase desconhecidos – despedi-me e saí, regressando às ruas do Bairro que se começava a agitar e de que tenho saudades, assunto que terei de resolver em breve.


Houvesse mais muros...



Na maioria das vezes um muro é apenas uma barreira que para pouco mais serve do que para esconder, proteger, isolar. Outras vezes, mais raras, alguém percebe que algo de diferente pode nascer de uma mera parede vazia. E o que é que pode acontecer quando essa parede circunda um quarteirão inteiro? Qualquer coisa como o espectáculo que se segue...


Ao longo de duas ruas e meia, o muro do que era um antigo quartel é a tela de um sem número de murais onde tantos temas reais e surreais são abordados por artistas urbanos que neles imprimem a sua visão do mundo, da vida e da morte, do céu e do inferno e, porque não, de Lisboa e de Aspen.


Sim, zombies! E dragões de diversas formas e cores, um Mickey DJ ou o gato da Alice têm lugar nesta profusão de imagens, de cores e de formas que necessitaria de pelo menos meio-dia para ter todos os pormenores devidamente apreciados.  


Retratos, auto-retratos, anjos e demónios, fantasmas, felinos, diabos, vampiros, extraterrestres, girafas e até galos de Barcelos, numa versão pré-escolar ... 


 
Até a Marilyn, impecavelmente representada na sua forma mais estilizada, tem a sua opinião a dar...


Mas o que me pareceu mais interessante é que há inúmeras homenagens a artistas irmãos que morreram muito antes do tempo, quase como se todo o mural fosse um grande memorial aos que já não voltarão a pôr a sua arte numa parede.

Tudo isto bem perto, em Campolide, a dois passos do sítio onde trabalho.

terça-feira, 22 de março de 2011

Um cheirinho a alecrim

No outro dia aproveitei uma ida ao teatro para sentir o Chiado num final de tarde de domingo. O bulício entre a Rua Garrett e o Largo de Camões parece indiferente ao dia da semana ou à hora do dia, mesmo com parte do comércio fechado. O Quiosque de Refresco cheio como sempre, algum trânsito acumulado, enfim, um cenário que não me parece mudar nunca, seja qual for o momento em que lá vou.


Mas basta começarmos a descer a Rua do Alecrim para nos lembrarmos que Lisboa se esvazia um pouco ao Domingo. Esta rua é uma das minhas favoritas na cidade, talvez pela cor dos prédios, talvez pelo alinhamento dos candeeiros na parede, definitivamente por se ver o rio ao fundo.


Resolvi entrar por uma perpendicular e perder-me por essas ruas, onde passei por dois dos hostels da cidade - que são dos melhores do mundo -, um a exibir os seus tectos trabalhados pela janela antiga, o outro com um desenho fenomenal em homenagem a alguns dos ícones característicos das ruas de Lisboa.

  
Como iniciada nestas lides da fotografia, não consigo deixar de me fascinar pelo que se consegue fazer com um tripé quando se fotografa à noite. Entre as luzes alaranjadas, Lisboa parece-me sempre uma cidade mágica...



segunda-feira, 21 de março de 2011

Por terras do Risco

No domingo este turista fez o que fazem todos os lisboetas assim que aparece um fim de semana de calor: atravessou a ponte 25 de Abril em direcção ao Sul onde o sol brilha um brilho diferente. Mas não fui à procura das praias, destino mais popular nos dias verdadeiramente quentes. Não, ainda estamos em Março e, apesar de ter ido para muito perto do mar, optei pelo campo – o parque Natural da Arrábida, mais concretamente a Serra do Risco que fica, em termos grosseiros, entre Sesimbra e a Serra da Arrábida propriamente dita.


O nosso passeio começou junto às famigeradas pedreiras que parecem insaciáveis na sua fome de serra. E a sua dimensão é tristemente impressionante. Apesar de não nos podermos aproximar delas, é possível avaliar o tamanho daqueles feios buracos por comparação com as máquinas que no domingo estavam paradas, não só por ser dia de descanso mas também pela menor procura que a pedra extraída tem em tempos de crise. Nem tudo é mau numa recessão.



A nossa subida acompanhou a linha da costa, por caminhos abertos de acesso fácil até um pequeno farol automático, a fazer lembrar que também este ofício está em extinção. A brandura deste troço convidava a que nos detivéssemos a observar (e a fotografar, claro) a flora local, com cores realçadas pelo primeiro dia de sol quente desde há alguns meses.


Desde os carrascos, carregados de pequeníssimas bagas vermelhas formadas pela acção de um insecto parasita, a partir das quais os romanos produziam a tinta escarlate, até aos narcisos que pavimentam o caminho e que a lei proíbe que se pisem, a flora local é bastante fotogénica.



A fauna também quis colaborar. Desde as laboriosas formigas às irrequietas borboletas, a bicharada andava animada e, chegados ao Píncaro (o ponto mais alto da Serra do Risco - 380m) fomos brindados com a passagem dos golfinhos do Sado, pouco comuns por aquelas bandas. Pena a lente ser tão fraca...


A partir do cume, onde parámos para aliviar à dentada grande parte do peso das nossas mochilas, começámos uma lenta descida por estreitas veredas por entre, e às vezes sob, os carrascos, onde a espaços tínhamos acesso a magníficas vistas sobre o oceano e sobre as pequenas praias e enseadas a que só acede ou com grandes doses de coragem (pelas falésias calcárias) ou de barco, para os mais timoratos.


À medida que descemos, os carrascos complicam-nos o caminho. Esta é a parte da caminhada em que se percebe que o nome desta planta deve ter origem nos arranhões com que nos brindam à nossa passagem nas zonas mais estreitas. Apesar de ser um arbusto (quase não há árvores em toda a serra) há partes do caminho em que nos cobrem completamente. Num desses troços aproveitámos a sombra para descansar e esperar pelo resto do grupo que seguia um pouco atrasado. É engraçado como pequenos detalhes, que ignoraríamos noutras circunstâncias, assumem proporções inesperadas quando estamos confinados a um espaço em que mal cabe uma pessoa sentada.
Quando o grupo finalmente se reuniu, continuámos a descida em direcção ao vale ocupado pelo Palácio e Quinta do Calhariz cujos terrenos ocupam o vale plano que se pode dizer sem grande rigor separa a Serra da Arrábida da Serra do Risco.
Foi uma tarde cansativa e que deixou marcas físicas (cansaço, arranhões e escaldões). Mas num sítio em que até os cardos teimam mostrar o seu lado bonito, tudo isso foi rapidamente esquecido pelo magnífico domingo a passear pelas terras do Risco.

terça-feira, 15 de março de 2011

Por outro lado...

Vivi vinte e oito anos da minha vida em Almada. Nos primeiros oito, morei num décimo quinto andar perto do rio, o que tornou a vista sobre Lisboa na primeira coisa por que me apaixonei no que à cidade onde nasci respeita. Não era exactamente esta, mas era muito parecida...


Depois mudei-me para as zonas mais recentes de Almada, que são (muito) feias e responsáveis pela imagem menos positiva que a generalidade das pessoas tem daquela terra. Ainda assim, Almada velha era o sítio que me acolhia nos passeios, nos amores, nas longas tardes e noites de teatro, nos passeios à beira-rio e em tantos outros momentos da minha adolescência e início da idade adulta. Tanto que, quando aos vinte e dois saí de casa dos meus pais, foi para o centro de Almada que fui viver e isso aproximou-me ainda mais daquela zona da cidade. Dois dos meus lugares favoritos no mundo são ali. Mas a eles voltarei noutra altura. Por hoje fico-me pela beira-rio e pela janela sobre Lisboa que essa zona é. 


O cais do Ginjal faz parte da história da minha família. O meu avô viveu lá durante muitos anos e o meu pai, na sua infância, aprendeu a nadar nas águas do Tejo, que ainda era suficientemente limpo para permitir tais aventuras. Depois, com o passar dos anos, as casas que dormiam sobre o rio degradaram-se aos poucos, afectadas pelo vento salino do Atlântico e pelo desleixo dos homens. Sempre me lembro do cais do Ginjal com as suas casas em ruínas, os seus pontões cheios de pescadores e a promessa nunca cumprida de requalificar aquele pedaço da cidade. Requalificada está apenas a área que circunda o elevador que nos permite ir de Almada velha para a beira do rio, que conta com um belo jardim, bem arranjado e cativante, que nos chama para a leitura ou para a mera contemplação.   


Se seguirmos pelo jardim, entramos no cais propriamente dito, onde as lages do chão brilham, gastas pelo tempo e pelas ondas mais rebeldes, e os artefactos portuários se impõem ainda, apesar de comidos pela ferrugem. E, uns metros à frente, temos esta visão quase inusitada, pois quem não conhece o sítio jamais imaginaria que no meio daquelas casas à beira da derrocada pode haver um restaurante.  


Mas há. Dois, até. O primeiro, que é responsável por esta cena magnífica, é definitivamente um dos meus favoritos na zona de Lisboa, pelo espaço, pela vista e, especialmente, pelo melhor arroz de cabidela que conheço.


Se seguirmos pelo cais e olharmos para trás, vemos a ponte em todo o seu esplendor. 


A ver pela amostra, gostava mesmo de ter conhecido o Cais do Ginjal nos seus tempos de glória.


Glórias agora, só as destes pescadores. Ou talvez não.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Está-se bem em Belém

Ainda me lembro da polémica em torno da construção do Centro Cultural de Belém. Não vai servir para nada! É dinheiro deitado fora! Como é que se constrói uma coisa destas ao pé dos Jerónimos? Aos catorze ou quinze anos, pouco ligava a polémicas, mas esta foi demasiado badalada para dela me esquecer. Tal como não me esqueço da primeira vez que lá fui para um dos seus concertos gratuitos nas noites de Verão que enchiam o Jardim das Oliveiras. A primeira de muitas. Foi nesses concertos que comecei a gostar de jazz. Dos Gaiteiros de Lisboa. E dos Irmãos Catita também. Um ou dois anos mais tarde, descobri o World Press Photo, comecei a ir às exposições pré-Berardo e a interessar-me pela arquitectura - invulgar, na altura - daquele lugar.


Depois descobri que aquela esplanada é um dos melhores sítios de Lisboa para escrever, para ler, para conversar, para estudar. Ou, simplesmente, para estar a par do que vai pelo mundo, sem pressas, sem preocupações...


Descobri também os concertos de fim de tarde, a que assistia sempre que podia e onde ouvi desde cantares alentejanos a peças de clássicos ou jazz experimental, algum dele interessante, outro simplesmente cacofónico, pelo menos para o meu gosto e ouvido. Descobri os Dias da Música, quando ainda eram gratuitos. Namorei, conversei e discuti debaixo das oliveiras. Talvez tenha chorado uma ou outra lágrima. Ou talvez não.


Para algo que se vaticinava supérfluo, é afinal um sítio onde se pode fazer muita coisa, nem que seja não fazer nada... 


... ou entrar numa casa feita de cortiça...


... ou, porque não, dormir uma boa sesta depois do café. 

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